segunda-feira, 22 de setembro de 2014

História LGBT: na mira do nazismo

Durante as primeiras décadas do século XX, a situação parecia ter melhorado, ou pelo menos em parte para as pessoas da comunidade LGBT. Isso, no entanto, não foi o fim da luta. Como já mencionei para para vergonhe deles e nossa, a história sofreu um segundo ponto de conflito.
Antes de narrar a parte sombria das décadas seguintes registradas na última publicação, gostaria de salientar um fato muito importante. A primeira cirurgia de readequação sexual realizada na Alemanha, sob a supervisão de Magnus Hirschfeld (Lembra-se dele? Um dos primeiros ativistas, o fundador do Comitê Humanitário Científico e do Instituto de Ciência Sexual). Einar Mogens Wegener, que após a cirurgia mudou o nome para Lili Elbe, foi uma artista dinamarquesa que passou por cinco cirurgias para tentar ter, com a maior precisão possível a anatomia feminina. Durante os anos em que Lili foi submetida às cirurgias, houve a publicação de um novo código penal dinamarquês que desconsiderou a homossexualidade como crime. De acordo com a documentação, Lili pode ter sido intersex, talvez afetada pela síndrome de Klinefelter; de fato, durante a sua operação é evidente que tinha ovários rudimentares. Infelizmente ela sofreu muitas complicações: a segunda cirurgia foi para transplantar ovários, mas tiveram de ser removidos em uma terceira e quarta intervenções por incompatibilidade. A quinta e última cirurgia consistiu de um implante de útero que, infelizmente, só conseguiu complicar ainda mais sua vida. Apesar de ser a primeira pessoa a passar por uma cirurgia de readequação sexual, Lili não foi tão conhecida como a americana Christine Jorgensen - nascido como George William Jorgensen Jr., cujo caso chegou a se espalhar em todo o mundo.
Lili Elbe, após a transação.
Uma vez que os nazistas chegaram ao poder na Alemanha, em 1933, as organizações LGBT foram banidas. A grande biblioteca do Instituto de Ciência Sexual explodiu em chamas, e o próprio Instituto foi destruído. Magnus Hirschfeld não estava na Alemanha durante a catástrofe, e depois de ouvir o que acontecera, nunca mais voltou. Ele tomou uma decisão sábia, pois os homossexuais em breve começariam a ser enviados aos campos de concentração, onde a luz não chegaria novamente. Um médico da SS, Carl Vaernet, começou seus experimentos em gatos e galinhas para encontrar a cura da homossexualidade através da administração de testosterona. Mais tarde, Carl iria praticar seus experimentos em seres humanos recrutados nos campos de concentração de Buchenwald, onde cerca de treze das cinquenta pessoas morreram imediatamente após serem utilizadas para os terríveis ensaios.
Os nazistas queimaram livros do Instituto de Ciência Sexual.
As Instituições que perseguiam os homossexuais transferiram-os para os campos de concentração, onde eram forçados a usar roupas bordadas com um triângulo rosa para diferenciá-los dos outros prisioneiros. Entre 1933 a 1945 foram julgados quase 100 mil homens por comportamento homossexual: metade deles foram condenados, e estima-se que cerca de 15.000 da metade eram prisioneiros de campos de concentração. No entanto, não se sabe quantos deles foram mortos no Holocausto, embora acredita-se ter sido 60%​​... ou mais. Após a queda do nazismo as coisas não melhoraram para os homossexuais, que foram presos pois feriam o código penal alemão, que ainda criminaliza esses comportamentos. Os homossexuais foram ignorados e, nem sequer foram considerados vítimas do nazismo. Pelo menos até 2002, quando o governo nazista alemão anulou julgamentos e pediu desculpas à comunidade LGBT. Sabemos que hoje existem alguns monumentos em várias cidades da Alemanha e do mundo para lembrar as vítimas homossexuais mortas no Holocausto. O governo italiano, aliado da Alemanha, mesmo sem ter promulgado uma lei que proibisse a homossexualidade (na verdade, se você se lembra, a metade do século XIX foi legalizado) escondeu-se por trás de leis existentes para abusar, prender e julgar muitos homossexuais. Em breve um decreto surgiu permitindo realizar uma limpeza, exilando-os para ilhas ou áreas montanhosas da própria Itália. Em comparação com as vítimas do nazismo, eles foram consideravelmente um número menor, mas, como na Alemanha, a situação não melhorou após o fim da guerra. A União Soviética voltou a criminalizar a homossexualidade com a pena de cinco anos de prisão. Da mesma forma, na Espanha de Franco da Lei Vagrancy foi alterada para retornar a criminalizar a conduta homossexual... Ambos os países recuaram. Por sua vez, as Filipinas, Grécia, Islândia, Tailândia, Portugal e Uruguai, pela segunda vez descriminalizam a homossexualidade. Suíça e Suécia também fizeram o mesmo pouco depois, após a definição da idade de consentimento de 20 anos; Polônia estabeleceu uma idade de 15 anos, tanto para heterossexuais como homossexuais. No Reino Unido, o relatório Wolfenden foi publicado com o parecer de uma comissão liderada por John Wolfenden sobre a homossexualidade, e recomendava que o comportamento homossexual entre adultos não tinha que ser crime. Eles também recomendaram que a idade de consentimento sexual entre os homens deveria ser de 21 anos, que era a maioridade. Imediatamente não houve mudanças na lei Inglesa, mas uma década depois, surgiu uma lei que recomendava que o parecer da comissão fosse adotado. No Reino Unido, França, Dinamarca, Suécia e Holanda foram criadas organizações cuja finalidade era defender os direitos da comunidade LGBT em todo o país, para lutar pela emancipação do coletivo. Fora da caixa, é de salientar que em 1938 a palavra "gay" começa a ser usada para se referir aos homossexuais. Agora chegamos a algo bastante interessante, no sexólogo americano Alfred Kinsey que publica seu livro Sexual Behavior Man (1948), seu produto de muita pesquisa. Depois de entrevistar mais de 5.300 homens, Alfred disse que 46% deles tinham reagido sexualmente para ambos os sexos, pelo menos uma vez na vida, enquanto 37% tinham uma ou mais experiências homossexuais. No entanto, apenas 4% tiveram comportamento homossexual ao longo de suas vidas. Alfred também concluiu que a homossexualidade existe em todos os níveis sociais e profissionais! Hoje isso é muito óbvio, mas, no passado, preferia-se acreditar que a lua era de queijo. E aqueles que ainda acreditavam que a lua era queijo, se desapontaram. Posteriormente Alfred continuou com a publicações de seu trabalho, agora voltado para o comportamento sexual das mulheres (1953), com base em dados coletados após entrevistar mais de 5.400 mulheres. 13% dessas mulheres tinham tido pelo menos um orgasmo homossexual durante a adolescência; no entanto, apenas 3% delas eram estritamente homossexual. Todos estes resultados fizeram com que Alfred assumisse que talvez 10% da população, tanto homens como mulheres, era de homossexuais. Ambas as publicações, conhecidas coletivamente como "Informe de Kinsey", descartaram a homossexualidade como doença e mostrou que era uma prática relativamente comum. Alfred também percebeu que havia mais níveis na sexualidade humana que a simples heterossexualidade ou homossexualidade. Então, ele criou sua própria escala, que variava de zero - exclusivamente heterossexuais a seis - exclusivamente homossexuais. No meio, o número três da escala referia-se, é claro, a bissexualidade. Seu trabalho foi muito criticado, mas serviu de base para outros pesquisadores em outras partes do mundo. Não poderia dizer se o esforço de Alfred mudou as mentes de alguns; mas provávelmente sim, pelo menos para aqueles com mentes abertas.
O triângulo rosa.
Para seguir falando sobre os Estados Unidos, tem lugar em 1950 o "terror lilás" - Lavender scare, em Inglês; como a homossexualidade era considerada uma doença mental, funcionários do governo acreditavam que estes eram fáceis de chantagear e, portanto, revelariam segredos de Estado. Isso levou 91 homossexuais a demição "por razões de segurança". O senador Joseph McCarthy contratou Roy Cohn como seu principal conselheiro, e juntos demitiram vários funcionários do governo por causa de sua orientação sexual e silenciaram outros rumores espalhados sobre sua homossexualidade. Como a vida sempre nos dá uma pitada de ironia, ele ficou surpreso ao saber que Roy Cohn era um homossexual reprimido. Pessoas como Roy fazem o mundo sombrio todos os dias um pouco mais. A demissão porém, que causou o maior escândalo foi a de Frank Kameny em 1957 (Devo esclarecer que nem Roy nem Joseph tiveram nada a ver com a demissão). Frank era astrônomo do exercito norte-americano, que, após sua demissão se tornou um defensor dos direitos dos homossexuais e um pilar do movimento LGBT. No início, Frank levou seu caso à Suprema Corte dos Estados Unidos, e embora tendo sua petição negada, a importância do seu desempenho foi apresentado como o primeiro caso de reivindicação de direitos civis com base na orientação sexual. Logo co-fundaria a organização Mattachine Society em Washington para continuar sua luta. Na verdade, ele promoveu campanhas para a eliminação das leis de sodomia ainda em vigor e a classificação da homossexualidade como uma doença mental pela Associação Americana de Psiquiatria. No final dos anos 50, o psicólogo Evelyn Hooker publicou o artigo The Adjustment of the Male Overt Homosexual (1957), no qual afirmava que os homossexuais não eram anormais e que, de fato, não há diferença entre eles e os heterossexuais, patologicamente falando. Este estudo foi um dos principais contribuintes para remoção da homossexualidade da lista de doenças mentais da Associação Americana de Psiquiatria cerca de vinte anos mais tarde. Edward Sagarin sob o pseudônimo de Donald Webster Cory publicou seu livro The Homosexual in America: A Subjective Approach "O homossexual na América: uma abordagem subjetiva(1951)", considerado uma das obras mais influentes na história do movimento LGBT. Foi o primeiro livro americano que descreveu a situação dos homossexuais, como eles eram discriminados em todos os aspectos, e os seus direitos.
Joseph McCarthy e Roy Cohn, respectivamente.
Finalmente, vou falar um pouco sobre Alan Turing. Este é um personagem que talvez poucos conheçam, mas que desempenhou um papel importantíssimo na descriptografia de códigos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Alan contribuiu de forma significativa na área de tecnologia da informação a ponto de ser considerado o pai da computação. No entanto, tudo o que ele deu e pôde dar à empresa foi ofuscado por sua mera orientação sexual. Em 1952, Alan foi processado por homossexualidade, pois ainda era um comportamento criminalizado no Reino Unido; a ele foi dado uma escolha entre dois anos de prisão ou passar por um ano de tratamento hormonal quimicamente de castração, escolhendo a segunda opção. Dois anos depois, Alan morreu de envenenamento por cianeto: alguns acreditam que foi suicídio, enquanto outros incluindo sua mãe acredita que foi um acidente. Em 2009, graças à iniciativa programador John Graham-Cumming, o governo britânico pediu desculpas pelo tratamento por causa de sua orientação sexual. Em 2011, surgiu outra petição ao governo, desta vez pedindo o indulto de Alan, mas foi negado alegando que a homossexualidade era punida na época. Era a mesma Rainha Elizabeth II, que concedeu um perdão real em 2013.
"Nós só podemos ver pouco do futuro, mas o suficiente para perceber que há muito a fazer." Alan Turing
Fonte: http://derjugend.wordpress.com/

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